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Colunista: Luis Felipe

Sessão gelada

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Quinta-feira. Uma onda de calor castiga os habitantes do Rio Grande do Sul. Os termômetros passam dos 37 graus. Meteorologistas explicam em linguagem técnica, falsamente adaptada aos leigos, a temperatura tórrida e a baixa umidade do ar. Sabemos como será daqui pra frente: uma onda de ar frio se choca com uma onda de ar quente, fortes temporais, estragos, a recuperação dos estragos e mais calor.

Na sala da minha casa, que se transformou numa fornalha, fuço no celular, vasculhando páginas da internet e os algoritmos me conduzem a uma entrevista do diretor Woody Allen. Descubro que ele acaba de lançar um novo filme. Chegando a impressionante marca de 49 filmes, com 86 e seis anos de idade. Vejo que o longa vai rodar num cinema da capital, com o horário único das 21:40. Não demora muito para que eu pergunte à minha mulher: “Amor, vamos dar uma volta no shopping? Tem um filme novo em cartaz que quero olhar”. Ela aceita.

Fazemos o tradicional desfile de roupas em casa. Experimento uma camisa xadrez, que parece ter encolhido algumas polegadas, e faz minha barriga parecer enorme. Ela primeiramente põe uma calça, pois diz que precisa se depilar, mas termina por ir com uma saia comprida. Eu escolho uma camiseta e descubro que minha barriga está realmente gigante! Antes de sairmos ela pergunta: “Não vai levar uma roupa quente? Eu vou levar um casaquinho”. Dou de ombros. Quero mais é congelar no ar do cinema.

Combinamos chegar cedo ao shopping. A ideia é passear pelas lojas, lanchar, sentar num banco e aguardar o horário. Um detalhe, somos precavidos: antes de qualquer coisa, vamos até a bilheteria do cinema e compramos os ingressos. Para nossa surpresa, todos os lugares estão vagos. Não é de estranhar, chegamos bem antes da sessão começar. O restante da programação ocorre como planejado.

Quinze minutos antes do início do filme, estamos entregando o bilhete que dá acesso à sala para uma moça que nos observa da cabeça aos pés, antes de desejar um bom filme.

Procuramos o assento, cuidando para não nos equivocarmos. J7, J8. É fácil ocupar o lugar de outra pessoa quando se é guiado apenas por faroizinhos de rodapé; o restante do cenário é um breu absoluto. Sentamos. Somente os dois na sala. Dez minutos para o início. Cinco minutos. O filme começa. Começa e termina com duas pessoas na sala.

No fim, ainda nos corredores do cinema, nos desvencilhamos para irmos ao banheiro. Quando nos encontramos novamente, estamos rodeados de gente. São pessoas de todas as idades, mas especialmente jovens. Olho para a minha esposa e digo a ela que quero muito saber que filme toda aquela gente estava assistindo. Abordo duas calorosas jovens que riem alto e pergunto. “Pânico 5”, elas respondem.

Minha mulher a essa altura já tinha colocado o casaco e eu nem havia visto. Dentro do carro, enquanto me arrumo para dar a partida, percebo que minhas pernas doem de frio. Faço o caminho de volta para casa com as janelas fechadas. Só aí percebo que estava há horas sentindo frio.

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