Escrever é uma batalha, sempre. Agora mesmo, acabo de levantar pela segunda vez. Na primeira, peguei uma banana e fui respirar inspiração junto à janela da minha casa da praia, olhando o mar. Não surgiu nada. Na segunda, abri a geladeira e fiquei olhando para o seu interior, como se dele pudesse saltar alguma resposta, até alcançar uma garrafa de água e, por fim, sentar novamente em frente ao computador.
Como, meu deus, criar uma crônica do final de ano se tudo já foi dito? Poderia falar dos planos de 2025, mas isso é tão batido quanto ganhar uma agenda de presente no amigo secreto da firma. Pensei em citar as mortes, Silvio Santos, Cid Moreira, Ziraldo, Zagallo, Ney Latorraca. Mas isso, além de ser muito triste para um texto de encerramento, é natural. Ano que vem serão outros, Roberto Carlos quem sabe, Elton John. Queria escrever uma crônica alegre, não um obituário. Falar de planos para 2025 também me parece uma ideia meio ultrapassada, além de ser repetida – já escrevi isso há alguns anos.
Assim, faltam-me opções.
E se, ao invés de falar sobre o que já passou ou o que virá, eu escrever sobre o que não aconteceu? Um ano imaginário, repleto de eventos que nunca se concretizaram. 2024, o ano em que ninguém esqueceu de regar as plantas, em que os aniversários foram comemorados com a presença de todos os convidados, e os alarmes tocaram exatamente no horário certo, nem um minuto antes, nem depois.
Foi também o ano em que o mundo não acabou. De novo. Nenhum meteoro, nenhuma inteligência artificial rebelde, nenhuma profecia de Nostradamus se cumpriu. E ainda assim, teve gente que acordou com o coração apertado, como se o caos fosse apenas questão de tempo.
Teve o dia em que o vento não soprou na praia, deixando as ondas paradas, como se o mar também tivesse tirado férias. E a semana em que todos os cães do bairro decidiram, por algum motivo inexplicável, não latir. Silêncio absoluto. Até os gatos estranharam.
Talvez seja essa a crônica que quero escrever: uma coleção de impossibilidades e absurdos cotidianos que, de tão improváveis, nos fazem rir. Porque, no fundo, é disso que precisamos ao fechar o ano: uma pausa no realismo e um mergulho na leveza do “e se”.