Os homens são suscetíveis aos vícios. E os vícios são como paixões – só que mais duráveis e angustiantes.
Como quase todo mundo, tenho minhas compulsões. Algumas inofensivas, como o gosto por Milk Shakes sabor café; outras podem ser arrasadoras, como torcer pelo Grêmio.
Sou gremista desde que me conheço por gente. Uns dizem que já fui colorado. O que nego veementemente, pois deve se tratar de uma pegadinha. Meus pais, que não gostam de futebol, dizem que é um hábito que meu padrinho – já falecido – incutiu em mim. Não sei a origem. Sei que sofro.
Ser apaixonado por um clube de futebol é a certeza de padecer. Veja: o clube disputa quatro ou cinco campeonatos por ano, e na maior parte das vezes, ganha um, ou então, nenhum. Ou seja, o futebol fornece uma alegria efêmera. Na maior parte do tempo, o torcedor convive com derrotas. Isso não pode ser algo bom.
Ano passado, tomado de um alento racional, decidi que abandonaria o futebol. Comuniquei a minha mulher (que é para quem falo das minhas promessas) e formulei motivos sólidos para a deserção: o futebol me faz mal, eu fico tenso em todos os jogos, não importa se ganhando ou perdendo; fico irritadiço, apesar de assistir o jogo calado; acho as discussões (brigas) de futebol tolas e sem fim; não aguento os jogadores, que são um poço de chatice (a maioria deles); não tolero torcedores xingando bandeirinhas, árbitros, jogadores, outros torcedores, feito homens das cavernas. Enfim, não tenho paciência para todas as atitudes insensatas relacionadas ao futebol.
Estabeleci uma data para concretizar minha promessa: o ano de 2021.
O ano iniciou com um Campeonato Brasileiro em andamento (reflexo do adiamento dos jogos em 2020) e com um Internacional às vias de ser campeão. Era aí que minha promessa começava a ir ladeira abaixo. Minha paixão pelo Grêmio só pode ser igualada com a vontade de ver o rival perdendo. Sequei o Internacional como nunca. Aliás, fui eu que marquei aquele impedimento – com os olhos – do Edenilson aos 51 minutos do segundo tempo contra o Corinthians. E deu certo. O arquirrival deixou escapar o campeonato – e eu deixei escapar minha promessa.
Daí em diante, a coisa degringolou. Segui acompanhado o Grêmio e o vi ser campeão gaúcho. O que abasteceu meu vício.
Cá estou eu hoje, sofrendo com um iminente – quase irreversível – rebaixamento do meu clube. Lamento não ter cumprido minha palavra. Essa hora estaria tranquilo, curtindo meus dias, aguardando feliz as festas de final de ano. Perdi para o vício.
Os vícios nos tornam dependentes. Dependo do Grêmio para ser mais feliz. Tem quem me critique, mas também tem quem não consiga abandonar o hábito de comer um mero doce após as refeições. Imagina uma droga mais potente, como o futebol.
Dica de filmes: Inacreditável – A batalha dos aflitos; Bastidores de um sonhos – O outro lado do título mundial.